A PEDAGOGIA WALDORF
Palestra
apresentada em 6/09/2012, no X Congresso Internacional de Tecnologia na Educação
– Recife/PE.
Paulo do Eirado Dias
Filho (2012)
Diretor Regional do SENAC/SE,
Pedagogo, Professor, Analista de Sistema, Especialista em Pedagogia Empresarial.
eirado@infonet.com.br e http://paulodoeirado.blogspot.com.br
“A nossa
mais elevada tarefa deve ser a de formar seres humanos livres que sejam capazes
de, por si mesmos, encontrar propósito e direção para suas
vidas." Rudolf Steiner.
A Pedagogia Waldorf.
É um dos reconhecidos frutos das teorias
de Rudolf Steiner, além da medicina antroposófica e da agricultura biodinâmica, dentre outros.
Introduzida pessoalmente por ele em 1919, em Stuttgart, Alemanha, em uma escola
para filhos dos operários da fábrica de cigarros Waldorf-Astória (daí seu
nome), a pedido destes. Distinguindo-se desde o início por ideais e métodos
pedagógicos até hoje revolucionários, ela cresceu continuamente, com
interrupção durante a 2ª guerra mundial, e proibição no leste europeu até o fim
dos regimes comunistas. Hoje, conta com cerca de 1.000 escolas no mundo, em
dezenas de países. Uma das principais características dessa pedagogia é o
embasamento na concepção de desenvolvimento do ser humano, que leva em conta as
diferentes características das crianças e jovens, segundo sua idade aproximada.
Assim, um mesmo assunto é abordado várias vezes durante o ciclo escolar, mas
nunca da mesma maneira, e sempre respeitando a capacidade de compreensão da
criança.
Aplicada
no Brasil desde 1956, a Pedagogia Waldorf baseia-se na Antroposofia - do grego “conhecimento sobre o Homem” - ciência espiritual
laica elaborada por Rudolf Steiner no início do século XX. Sua principal meta é
proporcionar à criança e ao jovem o desabrochar harmonioso de todas as suas
capacidades, considerando as esferas física, vital, emocional e espiritual com
vistas a um desenvolvimento integral e equilibrado.
Para atingir a plena formação do ser humano,
a pedagogia atua incentivando o desenvolvimento do querer (agir) por meio da
atividade corpórea das crianças em quase todas as aulas. Já, o sentir (emocional)
é estimulado na constante abordagem artística e nas atividades artesanais
específicas para cada idade. Por fim, o pensar (cognitivo) é cultivado
paulatinamente, desde a imaginação alimentada por meio de contos, lendas e mitos
– no início da escolaridade, até o pensar abstrato rigorosamente científico do Ensino Médio.
Uma das características marcantes da
Pedagogia Waldorf é o fato de não se exigir do aluno precocemente o pensar
intelectual, ofertando, dessa forma, condições para o desenvolvimento do pensar
imaginativo na criança e garantindo a vitalidade para o desenvolvimento
corpóreo e neurológico, indispensável nos primeiros anos de vida.
Outra característica é que o professor
Waldorf não dá nada pronto para a criança. Ela não ganha uma boneca pronta, a
ela é dada a oportunidade de criar sua boneca com
a imaginação. A pedagogia Waldorf é essencialmente prática, faz a criança
colocar literalmente a mão na massa. Ela acontece no movimento, na iniciativa e
na ação própria.
Almeja-se que as aulas sejam um preparo para
a vida, nas quais, se procura desenvolver as qualidades necessárias para que os
jovens floresçam e saibam lidar com as constantes e velozes mudanças que se
apresentam no mundo, com criatividade, flexibilidade, responsabilidade e
capacidade de questionamento.
Entende-se que o jovem, cada vez mais, precisa ser articulado
e capaz de se comunicar claramente, tanto se abrindo para o que os outros têm a
dizer, como, encontrando a melhor forma para expressar seus pensamentos ao
mundo. Para isso, a Pedagogia Waldorf, segundo seus adeptos, estimula o
desabrochar da individualidade, sem, contudo, afastar-se da convivência social.
Embasada
na concepção de ser humano e mundo desenvolvida pelo filósofo austríaco Rudolf
Steiner (1861-1925), essa pedagogia tem como objetivo o cultivo das
potencialidades individuais. Leva em consideração a diversidade cultural e se
compromete com princípios éticos humanos amplos e gerais. (LANZ, 1979)
No
âmbito da Pedagogia Waldorf, educar significa promover o pleno desenvolvimento
das capacidades latentes em cada ser humano, fazendo da criança uma pessoa capaz
de se integrar no mundo com autoconfiança, consciência e criatividade. Para
isso, mais do que meramente informar e treinar para eventuais futuras disputas
vestibulares ou profissionais, ao professor Waldorf cabe assumir uma tarefa
verdadeiramente formativa e incentivadora das reais aptidões de seus alunos,
ajudando-os a superar possíveis obstáculos na descoberta de seus próprios
caminhos de vida. Essa pedagogia não pretende ser, à primeira vista, original
ou revolucionária. Suas qualidades excepcionais só aparecem quando se compara
seu fundamento tão simples e lógico com aquilo que a educação, e
particularmente o ensino escolar, vieram a ser em nossa sociedade civilizada contemporânea.
A
orientação da Pedagogia Waldorf é bem definida, resulta da Antroposofia em
geral e, em particular do que esta tem a dizer sobre o desenvolvimento da
criança. Isso não significa que se lecione Antroposofia nas escolas Waldorf. A
Antroposofia não é uma religião; é uma visão do Universo e do Homem obtida
segundo métodos científicos e, portanto, desprovida de rituais ou práticas
associadas à fé. Também nela inexistem gurus. Só o puro conhecimento. Dessa
cosmovisão decorre a imagem do mundo, a própria existência das escolas Waldorf
e o trabalho de seus professores. Deste
modo, a Antroposofia não é ensinada aos alunos.
As escolas.
As
escolas Waldorf são totalmente livres no ponto de vista pedagógico, pertencendo
em geral a uma associação beneficente sem fins lucrativos. Idealmente, a
administração escolar é feita pelos próprios professores. Cada escola é
independente da outra: o único laço que as une é o ideal de concretizar e
aperfeiçoar a pedagogia de Rudolf Steiner, visando formar futuros adultos
livres, com pensamento individual, inteligente e criativo, com sensibilidade
artística, social e para com a natureza, bem como dispostos a buscar livremente
seus objetivos e cumprir os seus impulsos de realização em sua vida futura. O
amor que os professores Waldorf devem desenvolver pelos seus alunos, e o
conhecimento profundo que eles adquirem de cada aluno são outras
características fundamentais da pedagogia. Podemos citar como exemplo,
idealmente durante os oito anos do ensino fundamental cada classe tem um único
professor que dá todas as matérias principais, isto é, exceto artes,
artesanato, educação física e línguas estrangeiras. No ensino médio há um
professor que durante os três anos assume o papel de tutor da classe. Igualmente,
o médico escolar tem nas escolas Waldorf um papel fundamental de apoio
médico-pedagógico no acompanhamento dos alunos, e deve conhecer profundamente a
pedagogia.
Nos
Estados Unidos, as melhores universidades costumam aceitar preferencialmente os
ex-alunos Waldorf, pois sabem que são jovens diferenciados, com uma vasta
cultura, além de capacidade de concentração e aprendizado, e alta criatividade.
No
Brasil há 25 escolas Waldorf ou de inspiração Waldorf (sem contar com jardins
de infância isolados), sendo 4 delas em São Paulo (3 com ensino médio). A mais
antiga existe desde 1956, é a Escola Waldorf Rudolf Steiner de São Paulo, que
tem cerca de 850 alunos e 75 professores. Em 2010, segundo o site da Federação das Escolas
Waldorf no Brasil, há um total de 73 escolas e jardins Waldorf reconhecidos por
ela.
Estrutura Curricular.
O
currículo escolar no ensino Waldorf não tem a intenção de cultivar a preparação
da criança através de metodologias que estimulem a competitividade e o
isolamento caracterizados pela modernidade. Ao contrário, buscam levar a
criança a uma vida harmoniosa e íntegra, aonde ela venha a traçar com
discernimento seu próprio caminho (SETZER, 1988). As escolas Waldorf não se
denominam religiosas e não costumam estar ligadas a nenhuma doutrina religiosa
em particular, porém baseiam-se na crença de que há uma dimensão espiritual
para o ser humano e para tudo na vida. Buscam educar seus alunos
independentemente de seus contextos religiosos, procurando apresentar o
reconhecimento e a compreensão de todas as culturas e religiões do mundo
(SOCIEDADE ANTROPOSÓFICA DO BRASIL, 2011). O currículo das escolas Waldorf
aborda todos os aspectos legais da educação escolar de uma forma única e ampla.
O currículo é planejado para atender as diversas etapas do desenvolvimento da
criança e os professores se dedicam a criar um entusiasmo interior genuíno pela
aprendizagem que é essencial para o sucesso educacional (FEWB, 2011; MUTARELLI,
2006).
Uma importante
concepção dessa pedagogia é a de que a vivência deve preceder a teoria, desta
forma o conteúdo curricular deve ser ajustado ao momento particular do
desenvolvimento do aluno, de modo que haja uma identidade entre o que ele vive
e o que ele deve aprender. De acordo com a Antroposofia, a evolução do ser
humano em sua fase inicial pode ser dividida em três grandes etapas,
correspondentes a períodos de sete anos. A cada um destes períodos, é dado o
nome de setênio. As escolas Waldorf baseiam suas práticas pedagógicas de acordo
com cada um destes períodos (COSTA, 2005; LANZ, 1979; SETZER, 1988).
O professor Waldorf.
Agregado
ao Colégio Rudolf Steiner (SP) há o curso mais antigo de formação de
professores Waldorf no Brasil, reconhecido oficialmente. Outros cursos
acontecem por todo o país, alguns com título de pós-graduação lato sensu,
inclusive aqui no Nordeste.
Uma
meta central da pedagogia Waldorf é a de conduzir os alunos da educação à auto-educação.
A pedagogia Waldorf entende que o direito de educar a outros baseia-se na auto-educação,
premissa que os docentes da escolas Waldorf respeitam e tentam cumprir em todo
o seu agir, realizando, em primeiro lugar, um trabalho orientado para si
mesmos, enriquecido pela co-educação com os demais docentes. (Mizoguchi, 2006,
p.77).
O
professor tem um papel fundamental na educação baseada nos princípios da
Antroposofia. Segundo Lanz (1979), “o aluno Waldorf aprende de pessoas e não de
livros; ele não procura conhecimentos, mas vivências; e é o professor quem
principalmente as transmite”. Numa escola Waldorf, o corpo docente é uma
comunidade de pedagogos que são responsáveis somente perante sua própria
consciência pedagógica. Os professores devem ser escolhidos não pela sua
formação especializada, mas pela sua personalidade, sua capacidade pedagógica,
seus conhecimentos e experiência de vida. O professor é visto como um ser
complexo que, no caso ideal deve possuir as seguintes qualidades (LANZ, 1979):
• Um
conhecimento profundo do ser humano, através do estudo da Antroposofia e do
desenvolvimento do ser humano através de setênios;
• O
amor como base do comportamento social;
•
Qualidades artísticas, no que se refere à maleabilidade, fantasia e criatividade,
encarando cada aula como uma obra de arte;
•
Dominar seu próprio temperamento e linguagem, evitando abstrações e falando de forma
concreta e imaginativa;
•
Esforçar-se diante de problemas e situações cujo alcance normalmente lhe teria
escapado;
•
Sensibilidade e capacidade de reconhecer o seu trabalho nos próprios alunos,
descobrindo onde surgem pergunta e dúvidas nas almas dos seus alunos. Um
professor não precisa, necessariamente, ser um antropósofo, mas deve aceitar em
todos os seus aspectos práticos os princípios pedagógicos oriundos da
Antroposofia. Um professor abertamente ateu ou materialista é incogitável numa
escola Waldorf (LANZ, 1979).
O ensino em épocas.
A
Pedagogia Waldorf utiliza o ensino em épocas para possibilitar aos alunos um
maior aprofundamento nos grandes temas. Assim, por exemplo, é dada uma época de
História por três semanas, durante a qual o aluno vivencia uma integração de várias
matérias em torno do tema abordado. Pode-se seguir uma época de Matemática ou
de Português e assim, sucessivamente, as épocas se desenrolam ao longo do ano.
O ensino em épocas possibilita aos alunos receberem os conteúdos de forma não
fragmentada ou desconectada com o todo, ou ainda superficial. Através desse
sistema, a criança pode efetivamente "mergulhar" em cada matéria e
vivenciá-la profundamente.
O envolvimento dos pais.
É fundamental
que se integre família e escola, assim, são realizados encontros em que se
conversa e se aprende sobre a criança. Cada professor de classe realiza
reuniões periódicas com os pais e encontros anuais de confraternização da
classe, além de outros eventos, atividades e palestras na escola. Toda escola
Waldorf tem como princípio a ativa participação dos pais na vida escolar de seu
filho.
Princípio dos temperamentos.
Steiner
seguiu algumas ideias herdadas da sabedoria grega, segundo as quais, a
constituição física do ser humano poderia ser agrupada de acordo com seus
temperamentos (COSTA, 2005; LANZ, 1979). Os temperamentos são a maneira
característica que um grupo de indivíduos tem em comum de se expressar, de
se relacionar, de ver e viver o mundo. Conforme suas características,
os elementos de cada grupo agem e reagem de maneira semelhante (COSTA, 2005;
MUTARELLI, 2006). Baseado neste princípio, o conhecimento e o diagnóstico dos
temperamentos pelo educador são questões básicas no ensino Waldorf. São quatro
tipos básicos de temperamentos humanos: Colérico, melancólico, sanguíneo e
fleumático.
Os setênios.
Na
antiga cultura grega costumava-se dividir a vida humana em dez períodos de sete
anos ou setênios. Rudolf Steiner retomou essa ideia aplicando à Pedagogia
Waldorf, mas que também tem larga aplicação nos estudos biográficos realizados
por psicólogos e médicos.
Podemos
notar que ao final de cada setênio a criança ou o jovem alcançou um marco de
amadurecimento:
Aos 7
anos a criança atingiu a maturidade escolar.
Aos 14
anos podemos considerar que o jovem alcançou a maturidade sexual.
Aos 21
anos fala-se na maioridade ou também na maturidade social.
Práticas pedagógicas na Educação Infantil.
As
crianças do maternal e jardim de infância aprendem principalmente através da
imitação e imaginação, desenvolvendo o senso de admiração e reverência por
todas as coisas da natureza e nas relações humanas. As atividades da educação
infantil incluem (FEWB, 2011):
•
Histórias, contos de fadas, marionetes e o brincar criativo;
•
Canto, euritmia (arte corporal);
•
Jogos e brincadeiras de dedos;
•
Pintura, desenho e modelagem;
•
Assar e cozinhar;
•
Passeios na natureza;
•
Língua estrangeira nas rodas rítmicas e nas celebrações e festas.
Práticas pedagógicas no Ensino Fundamental.
As
crianças do ensino fundamental aprendem através da orientação de um professor
de classe que permanece com a mesma turma, por oito anos, exercendo um papel de
tutor. Ministrando várias matérias, o professor pode atingir os alunos por
vários ângulos, descobrindo seus dons e suas fraquezas. Todo seu trabalho
pedagógico pode se basear nessa diversidade; o que falta numa disciplina pode
ser compensado em outra, de forma diferenciada (FEWB, 2011; LANZ, 1979):
No ensino fundamental, o currículo inclui:
•
Línguas estrangeiras baseada em literatura, mitos e lendas universais;
•
História cronológica, incluindo as grandes civilizações do mundo e
geografia;
•
Ciência que pesquisa geografia, astronomia, meteorologia, ciências físicas e
biológicas;
•
Matemática que desenvolve competência em aritmética, álgebra e geometria;
•
Educação física;
•
Jardinagem;
•
Artes, incluindo música, pintura, escultura, teatro, euritmia, desenho;
• Trabalhos
manuais como tricô, costura, crochê, tecelagem, trabalhos em madeira.
Práticas pedagógicas no Ensino Médio.
O
ensino médio nas escolas Waldorf dedica-se a ajudar os estudantes a desenvolver
todos os seus potenciais como artistas, atletas, pesquisadores e membros da
comunidade. O curso de estudos inclui (FEWB, 2011; MANN, 2009):
• Um
currículo de humanidades que integra história, geografia, literatura e
conhecimento de culturas universais;
• Um
currículo de ciências que inclui física, biologia, química, geologia;
• Um
programa de matemática que prepara para a faculdade;
• Um
programa de artes e ofícios que inclui caligrafia, desenho, pintura, escultura,
cerâmica, tecelagem, impressão manual;
• Um
programa de artes dramáticas e musicais que oferece orquestra, coro, euritmia e
teatro;
• Um
programa de línguas estrangeiras;
• Um
programa de educação física.
- X –
Agradecimentos:
Maria Socorro
de Melo, ex-colega de SENAC, estudiosa da Pedagogia Waldorf, pelo apoio
decisivo na construção deste texto.
Aos diversos
autores de quem compilei trechos publicados na internet.
Referências Bibliográficas:
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da alfabetização 2. ed. 1995.
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STEINER, RUDOLF. A arte da educação, 3. vols. {Vol.1: O estudo geral do homem, uma
base para a pedagogia, trad. Rudolf Lanz e Jacira Cardoso; vol.2: Metodologia e
didática, trad. Rudolf Lanz; vol.3: Discussões pedagógicas, trad. Rudol Lanz}.
STEINER, RUDOLF. A ciência oculta. Tradução Rudolf Lanz e Jacira Cardoso. 6. ed.
2006.
Agradeço e registro os enxertos extraídos de:
Paulo Viníccius Vieira
Programa de Mestrado em Computação
AplicadaUniversidade do Vale do Itajaí (Univali)
Sonia A.L. Setzer
Palestra: A EDUCAÇÃO PODE CONTRIBUIR NA
PREVENÇÃO DO CONSUMO DE DROGAS?