A Economia da Atitude:
Conviver Saudável com o Ambiente e a Sociedade
Palestra
apresentada em 29/09/2011 no IX Congresso Internacional de Tecnologia na
Educação – Recife/PE
Paulo do Eirado Dias Filho (2011)
Diretor Regional do Senac/SE, pedagogo,
professor, analista de sistemas, especialista em pedagogia
empresarial. Mestrando em Ciências da Educação pela Universidade
Lusófona de Lisboa, Portugal. eirado@infonet.com.br
Outra chance
Em seu leito de morte, Josias
recapitulou sua vida.
E descobriu que podia ter vivido
uma vida bem mais
feliz se tivesse sabido
colaborar com os outros,
em vez de tomá-los como seus
adversários ou inimigos.
Procurou as origens deste seu
modo de ser.
Visitou mentalmente a igreja e a
escola dos seus tem-
pos de infância.
Recordou a gente da sua família,
revisou sua vida profissional, e encontrou em todas estas relações,
e ainda muito mais fundo, explicações para aquele seu
modo de ser e de ver,
fonte de tanta infelicidade...
E, talvez tarde demais, desejou ter outra chance....
(Arruda, 2006:66)
A história ensina que a economia se baseia em
pilares de sustentação, em torno dos quais tudo gira. Quando olhamos o mundo
moderno, isto é, da Revolução Industrial até os dias atuais, o que vemos é a
passagem por paradigmas econômicos fundamentais. O primeiro desses está
vinculado ao fazer, ou seja, às habilidades manufatureiras. Nelson, R.R. &
Winter, (2005:116) definem a habilidade como “a capacidade de ter uma seqüência regular de comportamento coordenado
que em geral é eficiente em relação aos seus objetivos, dado o contexto em que
normalmente ocorre.” Sua lógica determinante é a busca da eficiência e
precisão nas fábricas, que consiste em montar com eficiência, ajustar tempos e
movimentos humanos às máquinas e linhas de montagem e aumentar a eficiência energética.
... a produção industrial, até o século XIX, (...) cresceu
sobretudo pelo fato de os ramos artesanais terem sido industrializados por meio
da instalação de máquinas, porém, a organização interna da indústria não tinha
sido objeto de grandes cuidados. Somente após 1900 é que o engenheiro Frederick
Taylor desenvolveu um sistema de “administração cientifica”, com a finalidade
de desenvolver as áreas de trabalho específico (projetoexecução) e aumentar a
produção. (ROSSETTI, 1996: 10-11).
Enfim, surgem o fordismo e a administração
científica de Taylor, impulsionadores da produção em escala e da padronização
de bens. Essa é a economia da habilidade.
Pinheiro (1993:10-11) destaca que a crise do
sistema de produção fordista foi ocasionada por vários fatores, entre os quais
destacamos a sua rigidez, a crise do petróleo em 1973 e o conseqüente
endividamento do Estado que o impediu de desempenhar o papel de bem estar
social.
Como ficar parado não é condição que se aplique
à economia, a partir da Segunda Guerra Mundial durante a chamada guerra fria, logo
surge uma nova onda que rapidamente ocupa a maior fatia da economia mundial
contemporânea.
“Mudou o
mundo, mudaram os paradigmas. Quando aprendemos todas as respostas, mudaram as
perguntas...” (Carneiro, 1994:114). Essa
alteração de paradigma se acentuou após a década de 1970 com a comercialização
de produtos eletrônicos, digitais e a correspondente demanda por controle
numérico programável, em especial pela exuberante tecnologia da informação e
comunicação - TIC. Neste momento nasce a poderosa economia do conhecimento.
Nesse modelo econômico, os ativos mais valiosos
são os produtos intangíveis, aqueles desprovidos de matéria ou extremamente
miniaturizados como, por exemplo, softwares,
biotecnologia e transgenia, entretenimentos hollywoodianos, games, patentes, marcas e direitos
autorais. Essa economia do conhecimento, no mesmo ritmo veloz em que se expande,
também exclui, na medida em que exige escolaridade, empreendedorismo, pesquisa
e inovação. Insumos raros para países periféricos, onde capital humano e
capital social se mostram escassos e só são alcançados a contento no prazo de
gerações.
Essa mudança de paradigma no pensamento administrativo – do
sucesso com base na eficiência e em economias de escala para o sucesso cuja
raiz está em trabalhadores com conhecimentos culturalmente diversos – é a
essência da organização do século vinte e um. Nela, trabalho e aprendizagem são
essencialmente a mesma coisa, com ênfase no desenvolvimento da capacidade do
indivíduo de aprender. (Meister, 1999:3)
Vivemos extasiados pelo pensamento, afinal, só
aí somos verdadeiramente livres. Essa liberdade nos seduz na medida em que não
precisamos prestar contas do que pensamos. Assim, supervalorizamos o intelecto
presente em um discurso bem pronunciado, ainda que vazio, na competição do
vestibular, na lógica cartesiana e fria da informática e até na racionalidade e
inteligência de nossas crianças. Paralelamente, esquecemos ou tratamos de forma
distante, a formação do caráter, as boas maneiras, a convivência harmoniosa e
produtiva, o trabalho em grupo, as ações voluntárias de ajuda social, o cuidado
com o meio ambiente, o respeito ao próximo, o amor à vida, bem como de muitos
outros valores da alma humana que precisam ser igualmente educados.
A economia
da atitude, título desta palestra, nos remete a uma zona invisível sobre a
qual autores e formadores de opinião não costumam falar, mas certamente
representa uma significativa parcela do PIB. Economistas a denominam
externalidades negativas, contudo, convidamos a todos para a experiência de
transformar estes custos marginais numa questão central da economia.
Exemplarmente, uma pesquisa da Curriculum, empresa
de consultoria em recursos humanos, realizada com 417 empresas mostrou qual tem
sido o motivo mais recorrente que leva à demissão de um funcionário. Do
universo pesquisado, 34,1% (trinta e quatro vírgula um por cento) respondeu que
são atitudes ligadas a comportamento (falta de postura, atitudes inadequadas, dentre
outras) e 28,1% (vinte e oito vírgula um por cento) informou que a demissão se
deve ao baixo desempenho. O fato de o profissional não estar alinhado com os
valores e objetivos da companhia ficou na terceira colocação com 20,4% (vinte
vírgula quatro por cento). Enfim, tudo isso são questões de natureza
atitudinal.
São inúmeros consultores que nos apontam que a
principal causa de demissão nas empresas é atitude ou comportamento inadequado,
chegando a representar mais de 80% (oitenta inteiros por cento) do total das
causas apresentadas. Desta forma, em quanto eleva o custo das empresas a substituição
precoce e a rotatividade de funcionários? E quanto custa às famílias este mesmo
desemprego?
Vemos, a todo instante, campanhas públicas para
o combate à dengue. Muito da proliferação do mosquito vetor decorre da atitude
das pessoas em favorecer a acumulação de água em vasos, garrafas, pneus, etc.
Quanto custa a dengue à sociedade?
Da mesma forma, detritos, sacos plásticos e
diversos entulhos largados à rua são causadores de entupimentos de esgotos e
drenos de águas da chuva. Qual o prejuízo social de uma inundação urbana?
Dirigir embriagado ou cometer imprudências ao
volante são problemas comportamentais caríssimos aos cofres sociais. Dos
acidentes automobilísticos decorrem muitas perdas irreparáveis como mortes e
invalidez, além de danos materiais e serviços hospitalares onerosos.
Outros exemplos de externalidades negativas são
os produtos vendidos com omissão de informações nos rótulos e as propagandas
enganosamente veladas que nos levam a decidir e/ou usá-lo erradamente. Quanto
custa a todos a contaminação por agrotóxicos de um lençol freático? E os
efeitos colaterais da automedicação?
A violência urbana, a corrupção, as drogas, o
número tão grande de roubos de carros, que somente 3 ou 4 montadoras brasileiras
teriam condição de produzir o suficiente para repor os veículos roubados no país,
são comportamentos criminosos decorrentes de falhas de caráter.
O famoso cientista e poeta alemão Goethe afirmou
“é na solidão que se educa o talento e na
torrente do mundo o caráter”. Desta sentença concluímos que educar o pensar
sem educar o sentir e o agir produz pessoas potencialmente deformadas. Muitos
de nossos adolescentes vivem uma grande solidão, trancados em condomínios,
transportados para a universidade em condução escolar (sic), mergulhados na
internet ou nos games. Assim, perdem
a oportunidade de desenvolver o social, prioridade máxima dessa fase da vida. Apesar
de serem extremamente talentosos, muitos, porém, encontram-se inapetentes para
o social. Pela falta de embates nos contatos diretos com outros, como estão
quanto ao desenvolvimento do caráter? Qual o efeito do anonimato ou da
superexposição nas redes sociais da internet na formação do caráter?
Sou dos que acreditam na educação
(externalidade positiva) e no seu poder de bem formar seres humanos. Desta
forma, não vejo possibilidade de bem educarmos sem a participação direta das
famílias nas escolas e nem nas escolas que educam para o vestibular. A educação
deve atuar no intelecto e, obrigatoriamente, nas atitudes e nas ações. Afinal,
de tudo que estudamos só ficamos com aquilo que pomos em prática.
Halévy (2010:87) afirma “a humanidade está carente de sentido. Deu
a volta completa de seu umbigo. Quebrou muitos dos seus brinquedos: a Terra e a
natureza sangram por toda parte. Chegou a hora de deixar a infância
despreocupada e se tornar adulta. Chegou a hora de se abrir para o mundo e para
o real, e de se abandonar as fantasias arrogantes de onipotência e dominação
universal.”
Considerando que Durand (1999) define
competência baseada em três pilares quais sejam, habilidades, conhecimentos e
atitudes, associados aos aspectos técnicos, cognitivos e sociais vinculados ao
trabalho, e que Fleury e Fleury (2000) sustentam que as competências devem
agregar valor econômico para a empresa e valor social para o indivíduo,
concluímos que só seremos bons habitantes do planeta, ou seja, social e
ambientalmente competentes se fortalecermos o terceiro e mais debilitado dos
três pilares: o das atitudes.
Nas palavras de Halévy (2010:273), “ressacralizar e reencantar o
mundo e a natureza, a terra e o céu, para resgatar os erros frios e calculados
de cinco séculos de racionalismo redutor e de cientificismo totalitário.”
Esperamos ver esta nasciturna economia da atitude em ação ao produzirmos
uma sociedade de paz e reduzirmos o custo social gerado por atos destrutivos. Concluímos
que a educação é o melhor dos investimentos que se pode fazer para o planeta,
nossa casa comum e para a humanidade.
O custo não é educar, é não educar!
Referências bibliográficas:
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formação do ser humano integral: economia solidária, desenvolvimento e o futuro
do trabalho. Petrópolis, RJ: Vozes, 2006.
CARNEIRO, Cleo. T&D e a estratégia de
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Makron Books, 1994, p.103-115.
DURAND, T.
L’alchimie de la compétence. revue française de gestion (à paraitre),
1999.
FLEURY, A.
& FLEURY, M. T. L. - Estratégias empresariais e formação de competências – um
quebra cabeça caleidoscópio da indústria brasileira, São Paulo, Atlas, 2000.
HALÉVY, Marc. A era do conhecimento: princípios
e reflexões sobre a noética no século XXI. São Paulo: Editora UNESP, 2010.
MEISTER, Jeanne C. Educação corporativa: gestão
do capital intelectual através das universidades corporativas. São Paulo:
Makron Books, 1999.
NELSON, R.R.
& WINTER, S.G. Uma Teoria evolucionária da mudança econômica. Campinas:
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PINHEIRO, S.S. Relações de produção e de
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em Organização do Espaço) - Instituto de Geociências e Ciências Exatas,
Universidade Estadual Paulista. Rio Claro.
ROSSETTI, E. G. Flexibilização da produção: a
terceirização na indústria de Limeira-SP. 1996. 141 f . Dissertação (Mestrado
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Universidade Estadual Paulista. Rio Claro.